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terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Disputa sobre uso de porto privativo volta à pauta do TCU

Denúncia feita em 2009 será analisada ainda este mês

Fernanda Pires

A disputa no setor portuário promete mais uma rodada. O Tribunal de Contas da União (TCU) deve se posicionar ainda neste mês sobre uma denúncia de irregularidades na exploração de terminais privativos, que são autorizados a operar sem licitação pela Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq). A denúncia que está no TCU foi feita pela Federação Nacional dos Portuários, que argumenta que esses terminais movimentam, principalmente, cargas de terceiros em vez de próprias, o que caracteriza serviço público e, portanto, pela Constituição, exige prévia licitação. Esses terminais operam apenas com um termo de permissão, concedido pela Antaq.
Para operar, os arrendatários de portos públicos têm de preencher vários requisitos - contratação de mão de obra de um órgão gestor, pagamento de tarifas à autoridade portuária e submissão das ações a um colegiado. Como os terminais privativos estão dispensados dessas exigências, criou-se um "ambiente de assimetria concorrencial", na avaliação dos representantes dos trabalhadores.

A denúncia foi acolhida pelo TCU em 2009, mas o pedido de vistas do processo pelo ministro Aroldo Cedraz, em julho do ano passado, interrompeu a votação. O assunto retornou à pauta no fim de janeiro, mas foi retirado horas antes da sessão. Por meio da assessoria, Cedraz manifestou intenção de reapresentá-lo ainda este mês.

No país, existem dois tipos de exploração portuária: a de uso público, cuja concessão à iniciativa privada se dá por meio de licitação, e a de uso privativo, que dispensa o leilão. De acordo com a Secretaria de Portos, os terminais privativos foram concebidos como uma forma de grandes empresas (como Petrobras e Vale, por exemplo) escoarem a própria carga.

De acordo com a Lei dos Portos, de 1993, os terminais privativos também podem ser de uso misto, operando cargas de terceiros. O governo avalia que o "espírito" da lei era permitir que essa movimentação ocorresse de maneira acessória, para evitar ociosidade, quando não houvesse escoamento da produção própria. Mas a legislação não estabeleceu essa proporção, o que abriu brecha para autorização de terminais de contêineres que tenham como principal finalidade a movimentação de cargas de terceiros, ou seja, a prestação de serviço público sem assumir as obrigações de porto público.

Esses são os casos da Portonave, Itapoá (ambos já em operação e localizados em Santa Catarina) e da Embraport (SP), descritos detalhadamente no relatório do TCU. Juntos, eles já investiram aproximadamente R$ 3,15 bilhões.

O Decreto 6.620, de 2008, que regulamentou a Lei dos Portos, fechou essa possibilidade. Para se livrarem da licitação, os terminais privativos têm, agora, de comprovar preponderância da carga própria à de terceiros, e essas têm de ser complementares e da mesma natureza. O decreto, entretanto, isentou os terminais já autorizados de seguirem a nova norma.

O relatório da Secretaria de Fiscalização de Desestatização do TCU sobre a denúncia da Federação dos Portuários, contudo, discorda da isenção prevista no decreto. O parecer conclui que não existe ato jurídico perfeito em um termo de autorização, cuja natureza é "precária" e dada em caráter "unilateral" pela União. Segundo o relatório, tanto o decreto, quanto uma resolução da Antaq de 2005 - que determina que a carga própria precisa justificar por si só o empreendimento - devem ser aplicados imediatamente às autorizações já concedidas, "com efeitos ex nunc (desde agora)".

O relatório pondera que se conceda "um prazo razoável, em função de cada caso concreto, para que os terminais promovam a adequação de seu funcionamento às novas regras".
Na justificativa, o parecer recorre ao artigo 47 da lei que criou a Antaq, em 2001. Ele estabelece que "a empresa autorizada não terá direito adquirido à permanência das condições vigentes quando da outorga da autorização ou do início das atividades, devendo observar as novas condições impostas por lei e pela regulamentação, que lhe fixará prazo suficiente para adaptação".

Para o presidente da Federação Nacional dos Portuários, Eduardo Guterra, as autorizações dos terminais privativos de uso misto estimulam a precarização e a terceirização do trabalho portuário, além de enfraquecer os portos públicos, que tendem a receber menos carga. Durante a sessão do TCU interrompida pelo pedido de vistas, o relator do processo, ministro Raimundo Carreiro, disse não se tratar apenas de uma questão de disputa assimétrica entre os portos públicos e os mistos, mas de um problema de "burla à regra".

O presidente da Associação Brasileira dos Terminais de Contêineres de Uso Público (Abratec), Sérgio Salomão, espera que o TCU estabeleça "parâmetros de correção dessas anomalias". A Abratec reúne 13 associados, que investiram US$ 2,5 bilhões desde 1995. Em 2008, a entidade foi ao Supremo Tribunal Federal (STF) questionar a constitucionalidade da movimentação de cargas de terceiros nos portos privativos mistos.

Mais do que a concorrência desleal, Salomão reclama da insegurança jurídica. "Olhar o marco regulatório apenas sob a óptica da Lei dos Portos é uma visão restrita e inadequada. Trata-se de um conjunto de regras, que tem início na Constituição, passa pela Lei dos Portos, pela Lei de Licitações, pelo Decreto 6.620/08 e desemboca nas resoluções da Antaq", diz.

Fonte: Valor, 21/02/2011.

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